O ABC da prosperidade pecuária

Sérgio Raposo, da Embrapa Gado de Corte, elenca práticas que podem fazer a diferença em 2019

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Um ano novo que começa com o otimismo da renovação. Não devemos perder as vantagens que o embalo desses momentos propicia. Se, como já escrevemos, a pior coisa que podemos fazer nas épocas de crise é não fazer nada, acelerar as ações na retomada é o certo a se fazer.

Com intuito de encorajar os pecuaristas a irem nesta direção, fizemos uma lista de verbos em ordem alfabética que acreditamos ser o “ABC da prosperidade”. Nenhum deles é novidade, mas todos merecem ser lembrados de vez em quando.


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Eles podem ser efetivados isoladamente ou em grupo, conforme a capacidade e a conveniência de cada um. Seja do jeito que for, eles têm grande chance de causar impacto positivo na produção e na sua eficiência técnica/econômica. Segue o ABC:

Adubar – Esse verbo é pouco conjugado na pecuária. A questão é que não existe nenhuma riqueza que exploremos que seja inesgotável – e a fertilidade do solo não foge à regra. Cada boiada que vai para o gancho leva um tanto dessa riqueza e, com o tempo, a necessidade de reposição se faz sentir com a redução da produção e a degradação da pastagem. Ao se adubar antes desses sinais e fazer o correto manejo, produz-se mais arrobas por hectare, a forrageira ganha a competição com as daninhas e pereniza-se a pastagem. Ainda que seja importante usar critérios técnicos e fazer a análise de custo-benefício, quase sempre é mais econômico adubar do que recuperar ou reformar a pastagem mais para frente.

Baratear (compras e serviços) – Reduzir custos deve ser rotina em qualquer empreendimento, mas na pecuária, onde o preço do produto é determinado pelo mercado, isso assume uma importância ainda maior. Contudo, não é fácil conseguir insumos e serviços mais baratos sem abrir mão de qualidade. Uma alternativa é tentar pagar essas despesas coletivamente. No caso de insumos, comprar junto com outros produtores pode reduzir o preço devido ao maior poder de barganha gerado pela maior quantidade, além de ajudar a baratear o transporte com a encomenda de cargas fechadas. Já para os serviços, pelo menos o deslocamento dos profissionais pode ser rateado. Além disso, o “racha” pode eventualmente viabilizar o atendimento conjunto por um técnico mais gabaritado e, portanto, mais caro.

Consultar (técnicos) – Assim como a adubação, pagar consultores técnicos não faz parte do dia-a-dia do pecuarista. Em parte, isso ocorre porque é possível prescindir desses profissionais, repetindo práticas tradicionais. O problema é que, com a evolução técnica que tem ocorrido no setor e os custos crescendo mais do que a valorização da arroba, essa produção tradicional se torna cada vez mais inviável economicamente. Contratar um consultor que reveja todo o sistema de produção e que tenha a capacidade de, junto com o produtor, estabelecer arranjos mais eficientes e que evoluam com o tempo pode ser a diferença entre manter-se na atividade ou não. O maior empecilho para a contratação é considerar caro o trabalho do consultor. A solução pode ser o que foi sugerido no item “Baratear”.

Diversificar – Esse verbo pode trazer os maiores benefícios, mas também deve ser aquele com o qual devemos ter mais cuidado, pois uma nova atividade traz consigo as dores do aprendizado. Recomenda-se, então, que ao pensar em diversificar: (i) a atividade principal esteja bem estabelecida e, de preferência, em um bom momento; (ii) a nova atividade tenha complementariedade e sinergias com a principal e (iii) a nova atividade seja adotada na menor escala possível (como um confinamento para poucos animais) ou com um menor envolvimento (como uma integração lavoura-pecuária em parceria com um agricultor).

Eleger (prioridades) – Esse é do conjunto de verbos gerenciais e tem a importância de olhar a fazenda como um todo, analisar os gargalos e ranqueá-los. Além de, provavelmente, permitir obter o maior impacto (afinal, não é à toa que ele é prioritário), também ajuda a otimizar o resultado em cada ponto subsequente que tenha alguma interdependência com ele. Por exemplo, se o manejo de pastagens era o problema prioritário, o aumento de produção de forragem pela adubação (o item subsequente) será melhor aproveitado e assim por diante.

Focar (nas prioridades) – Também da família dos “gerenciais”, essa ação procura apenas garantir que não coloquemos o planejado em risco por distrações com pontos menos importantes, mas que às vezes são mais atraentes. Um bom exemplo disso é a sedução por novidades tecnológicas apresentadas pelo mercado. Elas podem fazer com que, na ânsia de ser “moderno”, o produtor deixe de atuar no básico ou nas prioridades do seu planejamento.

Gerenciar (mesmo!) – Não há produtor que não gerencie sua propriedade. O lembrete desse verbo aqui é para que o gerenciamento seja efetivo, seguindo o ciclo: planejar, checar, analisar e corrigir (quando necessário).

Harmonizar (produção e ambiente) – A pecuária tem sua imagem muito ligada ao desmatamento e a outros problemas ambientais. Apesar de todo sensacionalismo com que esses assuntos são tratados, o fato é que a pecuária mal feita é mesmo muito danosa ao ambiente (maiores fatores de emissão de gases de efeito estufa (GEE), grandes perdas de solo por erosão, perda de carbono do solo, assoreamento de corpos d’água, etc.). Por outro lado, sistemas pecuários bem conduzidos estão associados a menores fatores de emissão de GEE, perdas ínfimas de solo, aumento do teor de carbono no solo e produção de água. Um ponto particular que vale à pena lembrar é que as curvas de nível são muito eficientes em reduzir as perdas por erosão e têm sido negligenciadas, com efeitos ruins para o proprietário e seu entorno.

Inovar – No contexto da fazenda pecuária, o sentido de inovar é fazer qualquer coisa de maneira diferente do que se pratica usualmente. Por exemplo pode ser usar proteinados para quem só suplementa com sal mineral, fazer um semiconfinamento, para quem só usa o proteinado ou fazer o confinamento, para quem já suplementou todas as opções anteriores. Pode ser começar a usar inseminação artificial em tempo fixo, reformar uma pastagem com uma nova cultivar forrageira e tantas outras opções que o mercado de insumos oferece. Para valer a pena essa saída da zona de conforto, o melhor conselho é, por mais simples que seja a inovação, fazer com as melhores informações possíveis e de maneira bem gerenciada (ver o item “Gerenciar”).

Juntar (forças) – Essa ação já foi abordada no item “Baratear”, quando falamos de compras conjuntas, mas podemos ir além disso, com uma maior participação em associações de produtores locais e nacionais. A maioria das associações acaba sendo tocada por alguns abnegados por falta de uma maior participação da comunidade de produtores. Separar uma parte do seu tempo para participar e colaborar efetivamente com essas entidades é uma boa resolução que pode, além de trazer frutos para todos, ser fonte de satisfação pessoal. O associativismo em todas suas formas (incluído aí as oportunidades de cooperativismo) tem um potencial imenso para ser explorado no Brasil pecuário.

Lucrar – Aqui temos o ponto central da sustentabilidade: se a unidade produtiva não gera lucro, por que prosseguir na atividade? Desse modo, a busca por maior lucratividade é uma obrigação. Há a opção de tentar aumentar o faturamento com premiações pela qualidade da carcaça, mas as grandes oportunidades estão mesmo em tentar reduzir custos, como já comentado em “Baratear”. Além de comprar mais barato, outra maneira de melhorar o lucro é diluir os custos fixos, sendo uma das formas de fazer isso aumentar a produtividade com a inclusão de técnicas produtivas que tenham relação benefício:custo favoráveis. Assim, por exemplo, se a suplementação com benefício:custo favorável resultou em mais arrobas produzidas por hectare com a mesma lotação, o custo por hectare (sem contar o custo com a suplementação) não muda e, assim, precisamos de uma porcentagem menor das arrobas para cobrir esse gasto, ou seja, diluímos o custo fixo.

Manejar (melhor as pastagens) – Manejar é gerenciar e, aqui, elegemos as pastagens como o fator que mais contribui para o resultado de uma fazenda de pecuária de corte. Os pontos a destacar seriam: (i) respeitar os limites de entrada e saída da pastagem; (ii) conhecer as características de cada cultivar para usá-las da melhor maneira possível (por exemplo, fazer deferimento com Braquiárias e não com Panicum) e, por fim, (iii) repor nutrientes para evitar gastos com roçadas ou uma degradação de pastagem que leve à necessidade de recuperação ou reforma (sempre mais caras), como abordado em “Adubar”.

Nortear – Esse verbo entra aqui de maneira bem prática, para as rotinas da fazenda, significando que cada envolvido nas atividades da fazenda tenha a perfeita noção do que se espera dele, ou seja, ele tem um norte muito bem definido e, portanto, não perde tempo. Duas providências simples ajudam muito com que isso aconteça: (i) haver um painel em local visível a todos em que as atividades de cada um são descritas no tempo (podem ser as da semana, por exemplo) e (ii) Pelo menos uma vez por semana, avaliar o que não foi realizado, se há como melhorar em algum ponto, em que o envolvido pode relatar as dificuldades e receber orientações e aconselhamentos.

Organizar – Outro verbo que entra de maneira bem prática e humilde, ou seja, pode ser algo bem pequeno, como organizar as ferramentas de uma oficina ou as tralhas da montaria. O importante aqui, até mais do que a vantagem da organização (como não perder tempo procurando algo), é a irradiação do exemplo. Funciona assim: nas fazendas onde a organização é requerida de todos, cada vez menos há necessidade de cobrança devido a uma mudança do comportamento de cada um em favor da ordem. Pode-se esperar, inclusive, a incorporação desse comportamento naturalmente nas demais atividades. Nesse cenário, quando entra alguém novo na equipe, mesmo que pessoalmente ele não valorize a ordem, ele será compelido a adotar um comportamento condizente com o ambiente. O oposto também é verdade: bagunça gera bagunça e um ordeiro colocado num ambiente caótico, acaba infelizmente entrando na onda.

Planejar – Por não ser nada emocionante, exigir paciência e dar impressão de estar atrasando a ação em si, a fase do planejamento acaba sendo encurtada ou deixada de lado. É uma pena, pois um bom planejamento faz muita diferença. Nesta fase, particularmente, é preciso avaliar se o que será feito será vantajoso ou apenas perda de tempo e recursos. No caso das ações que passam pelo filtro do planejamento, temos menores risco de não dar certo. Por fim, apenas com um resultado esperado bem definido podemos nos certificar se cumprimos o objetivo proposto e, eventualmente, corrigir algo que possa ser melhorado.

Qualificar (a Mão-de-Obra) – Uma opinião que é quase unanimidade entre fazendeiros é a de que está cada vez mais crítico conseguir gente para trabalhar e, ainda mais difícil, manter essas pessoas na fazenda. Nesse contexto, investir em qualificar a mão-de-obra pode ajudar, seja por garantir trabalhadores mais efetivos, seja pela satisfação pessoal que essas qualificações geram para o empregado. Alguém que trabalha melhor e com mais satisfação, vale um salário melhor, fechando o ciclo virtuoso do investimento em capacitação da mão-de-obra. Uma sugestão de capacitação é em manejo racional dos animais, pois os ganhos acabam sendo também em eficiência, com potencial aumento de produtividade e redução de acidentes.

Reciclar – Não se trata apenas de bancar o ambientalmente correto quando decide-se adotar a coleta seletiva de materiais, mas da força de um exemplo positivo para os envolvidos. A ideia é que essa atividade seja quase um pretexto para o debate mais amplo sobre a responsabilidade ambiental de cada um e sobre como é importante a colaboração de todos para que funcione. O mais fácil e funcional é fazer a separação apenas em lixo úmido e lixo seco, sendo que apenas esse último é enviado para a reciclagem. Há casos de fazendas que conseguem, inclusive, vender esse lixo. O resultado costuma ser dividido entre os empregados.

Suplementar – No Brasil, suplementar as pastagens não é uma opção. No mínimo, usar o suplemento mineral é essencial para aproveitar o potencial energético das forrageiras, bem como na seca é fundamental a suplementação estratégica com proteína, para “matar a fome” dos microrganismos ruminais e fazer perda de peso se transformar em manutenção de peso (sal ureado) ou ganhos moderados (proteinado de baixo consumo, 1 a 2 g/kg de Peso Vivo). Daí em diante, é possível usar até quase 200 g/kg de Peso Vivo (inclusão equivalente ao confinamento a pasto), dependendo apenas de uma análise de benefício:custo que aponte sua viabilidade econômica e de que a estratégia se encaixe no sistema de produção. A suplementação, assim, garante que um lote terá peso mínimo para ir para o confinamento ou que vá direto para o abate ou que fêmeas de reposição atinjam o peso de entrada em serviço, etc. O fato é que, fazendo com esses critérios, a intensificação por meio da suplementação sempre aumenta a rentabilidade da fazenda.

Testar – Em conjunto com o “Inovar”, estaria no sentido de dar chance ao novo, mas fazendo-o em menor escala para certificar-se dos benefícios e avaliar as dificuldades antes de se lançar na atividade na escala pretendida. Pode ser como o caso já citado em “Diversificar”, do pequeno confinamento, mas pode ser, também, alguma novidade gerencial testada com um número menor de envolvidos, um novo equipamento emprestado ou alugado, etc.

Usufruir (de toda nova conquista) – Esse é apenas um lembrete para, a cada conquista, celebrar. Melhor ainda se for comemorado em equipe, com o reconhecimento de quem merece. Esse é um bom reforço positivo para manter o alinhamento das equipes com as metas e motivar as pessoas ao trabalho. São pequenas ações que agregam um valor emocional a relação dos empregados com a empresa. Isso pode ajudar muito na manutenção das equipes, fazendo as pessoas pensarem duas vezes ao receberem propostas de trabalho de outros lugares.

Zelar (pelo ambiente) – Aqui, renova-se o apelo para incluir nas preocupações de rotina, o zelo pela natureza. Não há ninguém que deva estar mais interessado nisso do que o produtor rural, pois sua atividade é a que mais depende que os serviços ambientais, prestados gratuitamente pela natureza, estejam funcionando bem. Alguns deles são óbvios, como no caso dos microrganismos do solo reciclando a matéria morta, mas a maioria passa despercebida, como a redução de evapotranspiração pela quebra de vento das árvores das áreas de preservação ou o trabalho de inimigos naturais de pragas das pastagens.

Essa é a forma de desejar um próspero 2019 aos produtores, de mais trabalho, sim, mas com melhores resultados. Na esperança que ajude a inspirar mudanças, fazemos votos que os fatores externos complementem esse cenário positivo. Que esse conjunto nos faça chegar no último ano desta década com um horizonte ainda mais otimista e renove nossa vontade de continuar a ser o celeiro do mundo e potência agroambiental que já somos.

 

Sérgio Raposo de Medeiros é pesquisador da Embrapa Gado de Corte

*As opiniões expressas nos artigos não necessariamente refletem a posição do Portal DBO

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