O que fazer para ter um pasto de qualidade na chegada das chuvas

Moacir Corsi é professor da Esalq, graduado em Engenharia Agronômica na Esalq/USP (1967), M.Sc. em Agronomia na Ohio State University (1970), Ph.D. em Agronomia na Ohio State University (1984), Pós-doutorado na West Virginia (1991) e na Massey University (2002).

Moacir Corsi é uma unanimidade quando se trata de manejo de pastagens, entre muitos outros temas que norteiam sua bela e longa carreira como professor do Departamento de Zootecnia da Esalq. Nesta entrevista, ele fala sobre o que o produtor deve fazer para ter um pasto de qualidade na entrada da temporada de chuvas, que se inicia com a primavera em grande parte do país.

Mundo do Leite – O que o senhor diria que é um pasto de qualidade?

Moacir Corsi – Pasto de qualidade é aquele em que o consumo é alto. Normalmente o produtor acha que o que caracteriza um pasto de qualidade é a porcentagem de proteína, por exemplo. Isso é errado! A gente caracteriza a qualidade pelo consumo, ou seja, o que a vaca é capaz de consumir naquele pasto. Evidentemente tem uma relação com a composição do material, mas eu posso ter uma composição excelente e o animal não ter acesso a essa forragem.


ML – Por que?

MC – Por exemplo: tem muita haste, o material está com folhas velhas no meio das folhas novas, então o consumo não é tão exacerbado por causa de fatores que interferem nesse consumo. Pastagem de boa qualidade é aquela que permite consumo alto, ou seja, muita folha verde com acesso muito fácil do animal.

ML – Existe algum pasto inadequado para gado de leite?

MC – Não. A diferença entre plantas forrageiras em relação à qualidade é muito pequena ou insignificante. A gente tem a mesma qualidade em diferentes espécies forrageiras se o manejo for adequado àquela espécie. O que acontece é que existem comparações entre espécies forrageiras mas com manejo inadequado para uma ou para outra espécie. Aí cresce aquela ideia de que certas espécies são melhores do que outras. Mas não é isso. Se você conduzir bem o trabalho de manejo, a qualidade das espécies não difere. Difere sim na produtividade, ou seja, na capacidade de lotação ou de suporte da pastagem.

ML – Com a chegada das chuvas, o que o produtor deve fazer para garantir um pasto de qualidade?

MC – A primeira coisa que tem que fazer, no final do período da seca, é acertar o resíduo pós-pastejo. Ou seja, quando os pastos iniciarem a rebrota eles devem estar com uma altura de resíduo adequada. Por exemplo: se for tanzânia, mombaça, o resíduo pós-pastejo deve estar em 20 centímetros. Isso em solo de fertilidade boa – ou seja, quando as adubações estão ocorrendo por cerca de dois, três anos. O pasto vai começar a crescer com um resto de forragem de 20 cm de altura. Agora, se a fertilidade desse solo é baixa, não pode fazer com 20 cm, tem que subir esse resíduo para cerca de 30 a 50 cm. Além de ficar atento para acertar o resíduo pós-pastejo, o produtor também deve controlar as invasoras e observar infestações de lagartas, que nessa fase inicial são muito comuns.

ML – E em relação à adubação, o que produtor deve fazer?

MC – Quando a precipitação acumulada em quinze dias atingir cerca de 80 a 100 milímetros, o produtor deve fazer a adubação baseada na análise do solo. Sempre de cobertura, sem incorporar. De preferência, se o produtor já roçou a área com uma certa antecedência, para acertar o resíduo, e o pasto começou a rebrotar, ele deve fazer um pastejo e em seguida adubar. Deve colocar os animais na área com o pasto já rebrotado – ou seja, roçou, o pasto começou a brotar, ele faz o pastejo e em seguida faz a adubação.

ML – Quais outros detalhes ele deve observar para manter um bom pasto?

MC – Bom, aí é o ciclo de pastejo. Depende de altura do capim. Se, por exemplo, em tanzânia, se tiver 20 cm de resíduo, ou seja, o crescimento partiu de 20 cm, ele vai atingir a altura de pastejo com 50 cm. Se o resíduo de pastejo estiver com 30 ou 50 cm, a altura de pastejo vai ser de 70 cm. É evidente que não se pode esperar que a planta atinja 70 cm no início das águas para colocar os animais, porque se o produtor faz rotacionado, os últimos piquetes vão passar. É preciso começar a fazer o pastejo com a planta um pouco mais baixa, mas vai ser um pastejo com uma intensidade bem fraca, ou seja, é uma pastejada em que os animais só tiram a ponta do capim e já passam para outro piquete, para chegar no último piquete com o capim na altura certa. Muitas vezes o pecuarista pensa: “Ah, mas se eu estou fazendo isso numa velocidade maior, o que vai acontecer é que vou voltar no primeiro piquete muito rápido!” Isso vai acontecer mesmo! Mas a planta, como ele deixou bastante área foliar nela após o pastejo, rebrota muito rápido.

ML – Qual é o tamanho ideal de um piquete e quantas cabeças é possível manter?

MC – A quantidade de animais por unidade de área depende do nível de adubação. Você pode regular a taxa de lotação através das adubações. Por exemplo, se aplicar 300 kg de N/ha, provavelmente vou colocar ao redor de 6 UAs por hectare. Mas no caso do gado de leite, essa quantidade de animais é muito maior, porque uma parte da nutrição do rebanho está vindo do concentrado, ofertado no cocho. Existe então uma substituição: daquela quantidade de concentrado que o animal recebeu no cocho, ele deixa de comer proporcionalmente uma quantidade de matéria seca lá no pasto. Então pode chegar a 10 UAs, 11 UAs, e esse aumento de animais se deve ao fornecimento de concentrado. Não existe tamanho ideal, mas como em gado de leite os rebanhos normalmente são pequenos, os piquetes também são pequenos. Normalmente são piquetes de 1 mil m², 2 mil m², 3 mil m², porque a quantidade de animais no rebanho é pequena.

ML – O pasto sozinho não dá conta de suprir as necessidades nutricionais das vacas? O concentrado tem sempre que estar presente?

MC – O pasto dá conta, mas o pessoal geralmente não faz o manejo adequado para atingir níveis elevados de produtividade com pasto. Então complementam com concentrado. Mas dá pra chegar sim a níveis de produtividade de 12 a 15 litros de leite por vaca/dia com muito pouco concentrado. Às vezes só milho moído atende as necessidades do animal, caso as adubações estejam ocorrendo, mas isso não é normal. Nem deveria publicar porque alguém vai querer fazer e não vai dar certo. Isso porque a pessoa não faz análise de forragem, não tem conhecimento suficiente do manejo do pasto, então o concentrado torna-se necessário.

ML – Como deve ser essa suplementação com concentrado?

MC – Isso é um pouco mais complicado. Porque você tem que ter uma análise da forragem, admitir um consumo dessa forragem, e depois você faz o complemento das necessidades nutricionais da vaca com a ração.

ML – Qual a lotação máxima de animais por hectare no pastejo rotacionado?

MC – Isso é um pouco complicado também, porque depende da eficiência do pastejo. Digamos que eu produza 20 toneladas de matéria seca por hectare. Essa é uma produção boa, não é ruim. Vamos dizer que um animal vá comer 12 quilos de matéria seca por dia. Então, se você dividir 20 toneladas por 12 quilos e dividir por 180 dias, teoricamente eu tenho que pôr 9 UAs por hectare. Só com pasto, sem nada de concentrado. Agora eu vou pôr o concentrado. Quanto vai pôr? Cinquenta por cento da dieta? Então a vaca vai consumir 50% de pasto e 50% de concentrado? Aí não são mais nove vacas, aí já são 18 vacas por hectare. Mas aí vem: quanto que a vaca come do que (o pasto) produziu? A gente chama isso de eficiência do pastejo, ou seja, qual a eficiência da minha máquina em colher o que eu produzi. Eu produzi 20 toneladas de matéria seca, mas ela não colhe tudo. Ela perde, ela estraga… Uma eficiência muito boa de pastejo é entre 70% e 80% – vamos ficar com 75%. Aí não são mais 9 vacas por hectare, e sim 7. Então, com 50% de concentrado acrescentados na dieta serão 14 vacas por hectare.

ML – Qual a época mais adequada para se fazer análise de solo para se conseguir um bom pasto?

MC – O melhor é fazer em fevereiro, março, no máximo, porque aí a gente ainda tem umidade no solo e assim eu posso fazer as recomendações de calagem, por exemplo. Quando eu atraso muito acabo fazendo a aplicação de calcário muito perto da época da chuva, e quando isso ocorre as adubações nitrogenadas são prejudicadas porque o nitrogênio perde-se com facilidade quando eu faço adubação sobre um calcário que não reagiu. O ideal é fazer a análise nesse período, quando estão ocorrendo ou após as últimas adubações do ano, para dar tempo de fazer a aplicação de calcário necessária.

ML – Quantos litros por hectare/ano é possível produzir tendo uma boa pastagem e complemento concentrado?

MC – O potencial é ao redor de 50 mil litros. Tem gente produzindo 25 mil, 30 mil litros por hectare, mas a média brasileira não chega a 2 mil.

Publicado na edição de Nº 93 da Revista Mundo do Leite.

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